Incorporadoras são beneficiadas com a alta na emissão de CRI

 Incorporadoras são beneficiadas com a alta na emissão de CRI

Montante soma R$ 39 bilhões de janeiro a agosto de 2024, o dobro de igual período de 2023

Por Circe Bonatelli – editada por Mariana Collini em 18/09/2024

As emissões de certificados de recebíveis imobiliários (CRIs) dispararam neste ano a despeito das regras mais restritivas impostas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em fevereiro. O cenário ajudou as incorporadoras a ganharem liquidez, com uma alternativa ao financiamento bancário.

As emissões de CRIs somaram R$ 39 bilhões de janeiro a agosto de 2024, o dobro do mesmo período de 2023 e a maior marca já registrada no período, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

O CRI é um título bastante popular no setor da construção, correspondendo a cerca de 10% de todos os recursos que abastecem a compra e a construção de imóveis no Brasil. A principal vantagem é a isenção de Imposto de Renda para pessoa física, fato que ajuda a atrair investidores.

Por meio deste instrumento, as empresas obtêm um financiamento que funciona como antecipação de recursos das suas atividades. O título é lastreado nos valores a serem recebidos com as vendas de imóveis na planta, aluguéis de imóveis residenciais ou comerciais, parcelas dos financiamentos concedidos a clientes, entre outros.

Em fevereiro, o CMN vetou as emissões de CRIs com lastro em operações de companhias não relacionadas ao setor imobiliário, cortando as asas de muitas companhias – de educação ao varejo – que vinham se aproveitando do instrumento com isenção fiscal para captação de recursos. Na visão do regulador, isso representava uma distorção do mercado, que visava dar incentivo para o mercado imobiliário especificamente.

Neste cenário mais restrito, as grandes vencedoras foram as empresas que atuam com projetos residenciais, comerciais, loteamentos e hotelaria, pois deixaram de competir com outros setores produtivos na atração de investidores.

“Depois da resolução do CMN, o mercado se concentrou onde deveria. O subsídio é para quem merece, que é o setor da construção, um grande gerador de empregos e que é o alvo da política pública”, afirmou Daniel Wainstein, sócio-diretor na Seneca Evercore, assessoria financeira que abriu uma área de renda fixa neste ano. Esse novo braço de negócios cresceu mesmo com as novas regras do CMN.

Segundo Luis Miraglia, sócio da Seneca Evercore, a restrição regulatória ajudou, inclusive, a reduzir as taxas para emissões das incorporadoras. “Antes era muita concorrência, e as empresas tinham que oferecer uma taxa maior para atrair investidores. A oferta secou um pouco isso, e causou um pequeno ajuste para baixo na taxa”, disse.

O diretor financeiro da Cyrela, Miguel Mickelberg, comentou, em um evento recente no Sindicato da Habitação (Secovi-SP), que os CRIs já representam metade do endividamento total da companhia, de R$ 3,4 bilhões (sem contar a fintech CashMe, subsidiaria). A outra metade vem de financiamentos bancários tradicionais à produção. “O mercado de capitais é bem importante para nós”, disse, na ocasião.

Novos destinos

Os certificados de recebíveis não atendem só empresas de primeira linha como a Cyrela. O líder de relações institucionais da Opea Securitizadora, Lucas Drummond, observou que a redução da concorrência ajudou a colocar no radar dos investidores as empresas que antes não atraíam tanto interesse na emissão de CRIs, como construtoras de pequeno e médio porte, e aquelas fora da Região Sudeste.

“É seguro dizer que, hoje, há no CRI uma alternativa de financiamento para as incorporadoras, inclusive para as operações menos óbvias, em praças que não tinham tanto olhar do mercado, como projetos no Sul ou no Centro-Oeste”, citou Drummond, referindo-se principalmente aos loteamentos.

Um levantamento da Opea mostrou que o valor médio das emissões de CRIs neste ano está em R$ 87,8 milhões, montante 22,5% menor do que no ano passado, quando foi de R$ 113,4 milhões. “O tíquete médio das operações está diminuindo. Isso é fruto da mudança na resolução do CMN, que acabou concentrando as operações em atividades específicas de atividades imobiliárias, que têm valor menor que das emissões para fins corporativos, como vinha acontecendo.”

O advogado Carlos Ferrari, sócio do escritório NFA, acrescentou que os fundos imobiliários também voltaram suas atenções para a compra de CRIs de incorporadoras após as restrições para emissão desses títulos por outros setores. Ferrari lembrou que, paralelamente, as emissões das Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) – emitidas pelos bancos – caíram nos últimos meses, porque a resolução do CMN aumentou o prazo mínimo de vencimento desses títulos, afastando investidores que buscavam liquidez imediata.

“Parece evidente a redução da participação dos bancos nessa composição do funding. As resoluções do CMN desse ano ajudaram as incorporadoras ao aumentarem sua participação nas emissões”, afirmou Ferrari.

GettyImages

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