Com poupança em queda, Fintechs ganham espaço no funding imobiliário
Crowdfunding e até soluções com foco no Minha Casa, Minha Vida surgem no mercado
Por Breno Damascena – editada por Mariana Collini em 15/05/2025
O saldo da poupança, principal motor de crédito da construção civil brasileira, registra consecutivas quedas ano a ano. De 2021 a 2025, os saques da poupança superaram os depósitos e o valor disponível para as construtoras via SBPE. Apenas neste ano a saída líquida já foi de R$ 52,1 bilhões. A expectativa de perder esses recursos têm estimulado o surgimento de soluções financeiras criativas focadas em disponibilizar crédito imobiliário para as incorporadoras.
Com perdas que já somaram R$ 244,12 bilhões desde 2021, a poupança tem, hoje, um saldo de R$ 752,1 bilhões, segundo estudo da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) com dados do Banco Central. Ou seja, este é o valor total disponível atualmente para as construtoras financiarem empreendimentos imobiliários via SBPE.
“A poupança, hoje, representa 31% da estrutura de funding imobiliário no País. Em 2023, a proporção era de 37%. E a maior parte do FGTS é para financiar o Minha Casa, Minha Vida”, observa Filipe Pontual, diretor executivo da ABECIP. “O mercado começa a buscar outros mecanismos. É neste cenário que o mercado de capitais faz mais sentido”.
Portanto, a queda da poupança não significa necessariamente uma queda nos lançamentos. Pelo contrário, ainda que o número de unidades construídas via SBPE demonstre um declínio, outras soluções de crédito se apresentam ao mercado imobiliário, como as letras de crédito imobiliário lideradas por fundos independentes e até iniciativas de crowdfunding.
Não à toa, as letras de crédito imobiliário se tornaram um importante financiador de grandes projetos imobiliários residenciais e comerciais. Mesmo o segmento econômico, que é prioritário na concessão de crédito imobiliário por causa do Minha Casa, Minha Vida (MCMV), já virou terreno fértil para soluções de financiamento. A fintech Makasí é fruto deste ambiente.
Funding para Minha Casa, Minha Vida
O Minha Casa, Minha Vida proporcionalmente, não sofre o impacto da queda na poupança. “Isso porque, além dos recursos do FGTS, os bancos têm focado em financiar cada vez quem está comprando imóveis”, analisa Pontual. Porém, nem mesmo o segmento econômico está alheio ao mercado de capitais e às soluções criativas de crédito.
No último mês, a Makasí anunciou o lançamento de um novo Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI) de R$ 120 milhões, voltado ao financiamento de projetos do MCMV. O produto, chamado de “Crédito para Exposição de Caixa MCMV”, oferece capital de giro às construtoras para viabilizar fases das obras que necessitam de caixa imediato.
“Não é um crédito concorrente à Caixa, nos propomos a disponibilizar um crédito complementar aos projetos”, explica Caio Bonatto fundador e CEO da fintech. “A construtora precisa percorrer uma longa jornada no início do desenvolvimento imobiliário até acessar, de fato, o financiamento. Sem esta linha de giro, muitas empresas não conseguem nem lançar o empreendimento”.
O CRI, explica Bonatto, prevê apoiar de 10 a 20 incorporadoras de médio porte que já têm histórico de atuação no programa, mas poderá ser ampliado conforme a demanda. “Nosso produto surge para mitigar o risco e garantir que o capital necessário esteja disponível no momento certo. O dinheiro pode ser usado, por exemplo, para terminar de quitar o terreno”, ilustra.
Lançado em parceria com a RBR Asset, este é o segundo CRI captado pela Makasí nos últimos meses. O primeiro, de R$ 120 milhões, foi lançado em novembro de 2024, dedicado ao financiamento de construção residencial para pequenas e médias incorporadoras e pessoas físicas. A aposta da empresa é na transparência do produto para atrair investidores.
Por meio de uma plataforma, é possível acompanhar as etapas do ciclo de construção e financeiro do projeto, além de ter acesso a pontos de melhoria e eventuais ajustes de rota. Em contrapartida, o modelo não exige garantia imobiliária das incorporadoras. “Com IA, examinamos dados da empresa e do projeto para fazer a análise de risco e cruzar com a dinâmica da empresa, de forma que bancos tradicionais não conseguem”, garante Bonatto.
Crowdfunding imobiliário
Em março deste ano, o SBPE contribuiu com R$ 739 bilhões e o FGTS com R$ 652 bi para o financiamento da construção. Em comparação, os CRIs, Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs), Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Letras Imobiliárias Garantida (LIGs) geraram, somados, R$ 1,050 trilhão e, aproximadamente 42% da fonte de recursos atuais.
Ainda assim, o crescimento das letras de crédito imobiliário não impediram o surgimento de outras formas de financiamento.
A fintech Finme, por exemplo, aposta no modelo de crowdfunding para impulsionar a construção civil. A ideia é permitir que qualquer pessoa possa investir em qualquer tipo de projeto imobiliário, permitindo às incorporadoras alcançar uma renda para complementar seus recursos financeiros.
“Bons projetos são descartados por causa de requisitos exagerados das instituições financeiras e fundos imobiliários. Mesmo uma boa operação, com bons parceiros e bons números, mas que não atinge o VGV esperado, acaba reprovada. Entendo que grandes fundos vão priorizar grandes projetos. Por isso, quero acolher os negócios pequenos”, argumenta Felipe Vergasta, CEO da Finme.
A proposta da empresa é diminuir os critérios eliminatórios e englobar projetos de forma geral. “A cada trimestre, emitimos relatórios que são distribuídos para os investidores. Hoje, temos de 150 a 200 investidores que estão com 200 mil aportados”, contextualiza. Porém, Vergasta explica que este é um projeto que exige investidores qualificados.
“Orientamos que os investidores comecem por outros caminhos antes de vir para este tipo de aporte. É um negócio com pouca liquidez e que exige maior qualificação. O primeiro passo deveria ser montar uma carteira mais tradicional, com renda fixa e variável”, comenta.
Nova estrutura de funding
Para Pontual, a expectativa é que fatores como alta de juros, queda na poupança e protagonismo do mercado de capitais continuem promovendo a transformação na estrutura de funding imobiliário. “Não existe uma bala de prata para o mercado imobiliário. Pode ser um crowdfunding, um acordo do banco com a securitizadora, uma letra de crédito imobiliário”, enumera.

Crédito: Tomasz Zajda/AdobeStock