Futuro dos negócios depende de foco e investimento no capital humano

Investing in education and training concept. Education funds for lending support to the productive value of education. Returns to investment in education based on human capital.
Pesquisa da Deloitte mostrou que o olhar para o bem-estar e desenvolvimento dos colaboradores é crucial; novas tecnologias devem auxiliar na busca do equilíbrio
Para garantir uma jornada segura e sustentável em direção ao sucesso e à relevância, em uma era em que as tecnologias disruptivas avançam, as organizações devem olhar com bastante cuidado para um de seus recursos mais preciosos: os colaboradores. A conclusão é do estudo Tendências Globais de Capital Humano 2024, produzido pela Deloitte, organização com o portfólio de serviços profissionais mais diversificado do mundo.
A pesquisa mostrou que as empresas que priorizarem desde já o desempenho humano darão um grande e crucial passo para seu sucesso. Foram ouvidos mais de 14 mil participantes de 95 países, incluindo o Brasil, para entender como as organizações estão atravessando o cenário atual do trabalho “sem fronteiras”, abordando novas perspectivas e mapeando as principais tendências dos ambientes corporativos.
A presença maciça de inovações no dia a dia dos profissionais – com tecnologias como inteligência artificial generativa (GenAI, na sigla em inglês), aprendizado de máquina, computação em nuvem, IoT (internet das coisas), blockchain, realidade aumentada e realidade virtual, robótica e big data – mostra que as referências tradicionais das relações de trabalho mudaram. Esse contexto dá às empresas espaço para experimentar e redefinir a gestão de pessoas. No entanto, apesar da necessidade de investimentos e atenção para impulsionar o desempenho individual das pessoas e desse espaço existente para inovar, ainda há desafios, revelou a pesquisa.
Os dados indicaram que 73% dos entrevistados reconhecem a importância de equilibrar as capacidades humanas com a inovação tecnológica; porém, apenas 9% relatam progresso nesse sentido. Portanto, existe uma lacuna significativa entre identificação e ação, o que se deve, principalmente, a desafios operacionais na implementação das mudanças.
“O papel da liderança em um mundo sem fronteiras será fundamental para melhorar o desempenho dos negócios, permitindo que as organizações se adaptem e se moldem ao futuro do trabalho. Com informações, tecnologias e ferramentas até então inéditas à disposição, podemos nos aproximar do que realmente importa: a criação de valor para a organização, para os trabalhadores atuais e futuros, e para a sociedade em geral”, aponta Ana Mocny, sócia de Capital Humano da Deloitte.
Tendências
A pesquisa mapeou sete tendências principais. A que foi considerada mais importante entre as analisadas, com maior impacto previsto no sucesso organizacional, é o equilíbrio entre privacidade e transparência para construir confiança. A tecnologia aumenta a transparência nas empresas, pois oferece oportunidades para medir e melhorar o desempenho de forma muito mais precisa. Porém, isso exige estruturas de responsabilidade para evitar abusos e garantir que a confiança seja fortalecida.
Apesar de 88% das lideranças reconhecerem a importância da transparência, apenas 13% se sentem preparados para lidar com o desafio, citando falta de alinhamento e restrições internas como obstáculos à implementação das boas práticas.
A ampliação da sustentabilidade humana – criando valor para as pessoas, promovendo bem-estar físico, mental, social e econômico – também deve ser vista como ponto principal na evolução das relações entre empresas e seus colaboradores. No entanto, a falta de ações mais efetivas ainda se impõe.
Iniciativas para avaliar e distinguir comportamentos e resultados contribuem para um ambiente mais saudável, inclusivo e produtivo, impulsionando a prosperidade dos colaboradores e criando locais de trabalho mais eficientes. Embora a importância disso seja reconhecida por 76% dos respondentes da pesquisa, apenas 10% afirmam estar liderando esse avanço.
O aumento do estresse no trabalho (53%) e o medo da substituição por tecnologia (28%) são as dificuldades mais comuns relatadas pelos colaboradores. Por outro lado, atitudes como vincular recompensas de líderes a métricas de sustentabilidade e envolver os trabalhadores na cocriação de seus papéis são essenciais para o sucesso dessa abordagem. Isso é reforçado pelo fato de 43% dos funcionários terem afirmado, na pesquisa, que a adoção dessas práticas no dia a dia os deixou em uma situação melhor do que quando iniciaram na empresa.
Medição de produtividade com novas tecnologias
O estudo também aponta a necessidade de ir além das métricas tradicionais de produtividade para medir o desempenho humano, com 74% dos entrevistados considerando crucial a busca por melhores formas de avaliação.
Aqui, mais uma vez, aparece o caráter desafiador e o descompasso entre mudanças necessárias e ação: apenas 8% dos líderes se consideram na vanguarda dessa mudança e 17% disseram que sua empresa é muito ou extremamente eficaz nesse ponto.
Novas abordagens, nesse aspecto, são possíveis com a utilização das tecnologias atuais, como ferramentas de aprendizagem de máquina e análise de dados de diversas fontes (e-mail, plataformas de colaboração, ferramentas sociais, dispositivos vestíveis, neurotecnologia, sensoriamento biométrico, headsets de realidade aumentada e rastreamento de localização, etc.). Elas permitem avaliações mais abrangentes e compartilhadas, beneficiando tanto a organização quanto o funcionário por meio dos dados coletados.
“A pesquisa vem destacando cada vez mais a importância de redefinir as relações com as pessoas no ambiente corporativo, enfatizando a necessidade de focar menos em como os trabalhadores beneficiam a empresa e mais em como a empresa pode criar valor para os indivíduos”, explica Luiz Barosa, sócio de Consultoria em Capital Humano da Deloitte. “Essa abordagem, que abrange aspectos físicos, mentais, sociais e econômicos da vida, é essencial para promover um ambiente de trabalho mais saudável, inclusivo e produtivo, com sustentabilidade humana e a confiança”, acrescenta ele.
IA x imaginação
A pesquisa destaca ainda o “déficit de imaginação” em muitas organizações em relação ao potencial disruptivo da inteligência artificial generativa. Embora 73% dos respondentes considerem importante alinhar as capacidades humanas com a inovação tecnológica, apenas 9% estão progredindo nesse sentido.
Para superar esse desafio, as empresas precisam cultivar e escalar capacidades humanas como curiosidade, empatia e criatividade, proporcionando aos seus times autonomia para moldar seu trabalho, o que requer certa dose de imaginação, já que a IA e outras tecnologias assumem papéis cada vez mais centrais na vida profissional, mostra a pesquisa.
A proposta como uma solução para potencializar a inovação e o desenvolvimento humano é a criação de playgrounds digitais – espaços seguros para experimentação e cocriação de novas metodologias, para exploração dos múltiplos futuros possíveis, também conhecidos como hubs de inovação, e que envolvem não só locais físicos, mas uma nova abordagem. Dos respondentes da pesquisa, 65% dos participantes entendem a importância desses espaços, entretanto, apenas 10% dos líderes estão progredindo significativamente.
O cultivo de microculturas, conferindo maior autonomia aos pequenos grupos de trabalho, fornecendo-lhes recursos para desenvolvimento e alinhando suas práticas com os princípios organizacionais, também é destacado como algo central para atrair e reter talentos. O estudo apontou que 71% dos respondentes consideram essa tendência importante, mas sua implementação é desafiadora.
A pesquisa revelou que 73% dos trabalhadores já deixaram um emprego devido à falta de identificação cultural e às dificuldades dos líderes em promovê-la, ressaltando o valor desse tema para a retenção de talentos.
O estudo da Deloitte detectou ainda a relevância de promover uma transformação do setor de Recursos Humanos (RH), passando de uma função especializada para uma disciplina sem fronteiras, integrada com os negócios e a comunidade. Enquanto 72% das organizações reconhecem a importância dessa mudança, poucas estão avançando.
“Operamos em um mundo onde o trabalho não é mais definido por funções específicas, o local de trabalho não se limita a um espaço físico, muitos trabalhadores não são mais empregados tradicionais e os recursos humanos não estão mais isolados”, reforça Roberta Yoshida, sócia de Consultoria Empresarial e líder da prática de Capital Humano.
“Essas fronteiras, anteriormente vistas como a ordem natural das coisas, estão se dissolvendo e os modelos tradicionais de trabalho estão perdendo os limites. Podemos observar uma lacuna significativa entre a compreensão sobre a importância da adoção de práticas voltadas à transparência e sustentabilidade e a prática de ações relevantes para endereçar esses temas, tanto no mercado global quanto no Brasil. Portanto, é essencial reconhecer que impulsionar o desempenho humano e liderar em um mundo sem fronteiras trará muitos desafios operacionais”, afirma a executiva.
Uma liderança mais integrada e multifuncional é necessária, exigindo novas formas de responsabilização e a adoção de novas mentalidades e melhores práticas em todos os níveis da corporação.

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